domingo, 31 de outubro de 2010

Flor

Existo. No princípio existo somente, sem aspirações quaisquer. Mas em um instante todo o meu ser revolve – há um destino, há um curso a ser seguido. É força maior que todo o meu eu e mais mil outros eus somados. Me faz ser atirada em um processo que não entendo nem quero. Para onde rumo?
Sigo ensimesmada como sempre desde o momento pontual de eternidade em que passei a existir. Mas a força me impede, me impulsiona em um abismo lancinante. É como se desse ensimesmar fossem arrancadas de mim infinitas camadas. Removidas lentamente, uma a uma, com uma dor agonizante que não se descreve em palavras. Desprendem-se as camadas todas de mim, mas também umas das outras, ainda que continuemos unidas por um vínculo que agora nos é estranho.
Era una, existia plenamente em mim: era coisa-em-mim. Agora a dor afiada torna-me aberta e exposta. Cada espaço que separa-me de minhas camadas é um abismo de agonia. Como em uma cruel ironia, é nessa incrível dor, é nessa desesperada ausência que reside toda a beleza que carrego.
Sou flor.

Um comentário:

  1. Flor, você. Que bom poder ler seu perfume quando eu quiser, agora! (adoro sinestesias)=)

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